(Ilustração: Pawel Kuczynski)
Por Artur Pires
Hoje, 13 de maio de 2013,
completam-se 125 anos da abolição da escravidão no Brasil. Na teoria,
sublinhe-se. Na prática, as condições de acesso e oportunidades de inserção nos
processos sócio-econômicos, culturais e educacionais à população negra brasileira
continuam dificílimas e marginais.
Apesar de constituírem mais da
metade da população brasileira (IBGE, 2010),
com 51% dos habitantes do Brasil, os negros (pretos e mulatos) são recorrentes
na grande maioria dos indicadores negativos do Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH). Se o país fosse dividido pelas “raças” e pelo acesso destas às
oportunidades, constataríamos um Brasil com padrões nórdicos de um lado – a
face branca -, e outro de índices semelhantes aos países mais pobres da África
– o pedaço negro.
Ainda que o Brasil tenha evoluído
em IDH, melhorado a distribuição de renda, diminuído a taxa de analfabetismo, a
população negra continua sendo a que menos tem acesso a estas recentes
conquistas sociais, pois, segundo estudo de 2010 do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA), mais de 70% dos brasileiros situados na faixa de
vulnerabilidade social e econômica são negros.
Mercado de trabalho
No mercado de trabalho, a
desigualdade proporcionada pela cor da pele também salta aos olhos. Segundo o Relatório Global sobre Igualdade no Trabalho, de 2011, estudo
da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a taxa de desemprego é bem
maior entre negros. Já outra pesquisa desenvolvida pelo Instituto Ethos, em 2010, mostra que quanto maior
o nível hierárquico nas empresas no Brasil, menor a probabilidade de ter um
negro no comando. No ano do levantamento, os negros representavam residuais 5%
dos executivos e 13% dos gerentes nas 500 maiores empresas brasileiras.
Ainda hoje, 125 anos após a abolição
da escravatura, ainda é comum tomarmos conhecimento acerca de trabalhadores sendo
escravizados, principalmente em atividades no campo, relativas ao agronegócio. Segundo cálculos da Comissão Pastoral da Terra (CPT), há cerca de 25 mil trabalhadores
laborando sob condições subumanas, sem direito a água potável, alojamento,
salário e, o mais absurdo, com o direito à liberdade de ir e vir cerceado. São,
em sua maioria, semianalfabetos e negros. 125 anos depois!
Índices de violência
(Ilustração: Laerte)
Outro dado alarmante que recai
com maior força sobre a população negra brasileira diz respeito aos indicadores
de violência. A mortalidade de jovens negros entre 15 e 29 anos é três vezes
maior do que entre jovens brancos. Segundo estudo do IPEA de 2011, intitulado Dinâmica Demográfica da População Negra Brasileira, em 2001 e
2007 – anos pesquisados - a principal causa externa de morte na população negra
foram os homicídios, responsáveis por aproximadamente 50% dos óbitos. O grau de
vitimização da população negra é assustador! Há uma probabilidade 103,4% maior
de um negro ser vitimado do que um branco. Quando se analisa só a faixa etária
dos jovens de 15 a 25 anos, essa probabilidade aumenta para 127,6%.
Em suma, com esses números alarmantes, constata-se que a violência homicida no Brasil tem rosto e cor: jovem, negro, morador da periferia das grandes cidades.
Acesso à educação
No que diz respeito ao acesso à
educação, a situação se mantém extremamente desigual. Segundo o IBGE (2010),
70% dos 14 milhões de analfabetos do país são negros. De acordo com o pesquisador Kabengele Munanga, em Políticas de ação afirmativa em benefício da população negra no Brasil:um ponto de vista em defesa de cotas, a situação é tão desfavorável à população negra que se, hipoteticamente, por um passe de mágica, os ensinos básico e fundamental melhorassem
seus níveis para que os estudantes de escola pública pudessem competir em igualdade de condições
no vestibular com alunos de colégios particulares, os estudantes negros
levariam mais de três décadas para atingir o atual nível dos alunos brancos.
No ensino superior, o quadro é
também bastante excludente. De acordo com pesquisa de 2011 da Associação
Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes)
sobre o perfil dos estudantes de graduação no Brasil, constatou-se que apenas
8,72% dos estudantes são pretos, ao passo que os brancos representam 53,9%
desse universo, e os pardos, 32%.
(Ilustração: Angeli)
Como se percebe, a questão racial
naturaliza e contribui para o enorme fosso de desigualdade no Brasil. Há um claro desequilíbrio
de oportunidades de acesso às diversas esferas da sociedade. Todos os
indicadores sociais apontam para um deletério quadro de vulnerabilidade social
da população negra brasileira, seja no mercado de trabalho, no acesso à moradia
urbana, à terra, à educação e à justiça.
A mobilidade social do negro no
Brasil - ou seja, sua ascensão social em relação ao conjunto da sociedade -
continua em patamares residuais. O que se conclui dessa realidade é que, apesar
dos tímidos avanços sociais obtidos na última década, a situação da população
negra no Brasil continua extremamente vulnerável. Se nada de concreto, que fuja
às soluções fáceis e politiqueiras, for feito no sentido de reverter esse
quadro social de marginalização e exclusão, a abolição da escravatura no Brasil,
para a população negra principalmente, nunca passará de um mero acordo de congressistas
no século XIX que chegaram ao consenso de que um outro modelo de exploração,
que não o escravista, era dali para frente mais lucrativo a eles,
parlamentares, e aos senhores feudais da época, os latifundiários do café.
Há 125 anos abolia-se a
escravidão no Brasil. Para quem?
* Texto inserido nos anais da Câmara Municipal de Fortaleza
* Texto inserido nos anais da Câmara Municipal de Fortaleza
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