sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Há algo de podre no sistema político brasileiro


Enquanto o financiamento público não for adotado como única alternativa para doações de campanhas, a situação retratada acima vai teimar em existir não só no mundo dos quadrinhos (Charge: Ricardo Coimbra)

Por Artur Pires

Parafraseando Hamlet, famoso personagem shakespeariano, diria que há algo de podre na política brasileira. E como fede! Os homens de Brasília evitam pôr o dedo na podridão com medo do odor altamente desagradável subir às narinas nacionais, pois, sabido que é, até os desprovidos dos recursos olfativos seriam contaminados pela verdade fétida: a estrutura que sustenta o sistema político brasileiro é uma merda!

O nariz de cera acima é tão somente para contextualizar uma necessidade urgente no Brasil: a reforma política. Sim, uma reforma que extirpe definitivamente as anomalias existentes na política brasileira – que são muitas! Nem FHC tampouco Lula tiveram coragem para fazê-la. Dilma já caminha para o fim do seu segundo ano à frente do Palácio do Planalto e o assunto nem sequer foi posto em pauta pela presidenta.

Em suma, o sistema político-partidário brasileiro hoje caminha numa direção perigosa e sem volta, caso nada seja feito no sentido de impedir o avanço desse modelo. Os cargos políticos, que deveriam ser representativos do e para o povo, tornam-se cada vez mais meios de ganhar dinheiro fácil e perpetuar-se no poder, elegendo cônjuges, filhos, primos, tios, o periquito e o papagaio. Política, infelizmente, virou sinônimo de negócio para a maioria dos políticos e de corrupção para a maioria dos eleitores.

Aqueles que detêm a máquina de governo em suas mãos, seja municipal, estadual ou federal, fazem de tudo para manterem seus reinados, lançando mão, muitas vezes, de métodos escusos para tal fim. Mas por quê? Ora, porque o poder embriaga, já dizia Maquiavel no século XVI. Os fins justificam os meios? Penso que não. Na verdade, os meios que utilizamos para alcançar o fim é que dizem o que somos. Enfim, deixando a filosofia de botequim de lado, o fato é que em períodos eleitorais – e muitas vezes fora deles também - quem está no comando esquece-se de governar e usa de todas as vantagens que o poder propicia para se reeleger ou, quando não é mais possível a reeleição, eleger alguém de sua confiança e, assim, continuar mamando nas tetas da administração pública, feito bezerro esfomeado.

(Charge: Roko)

A questão central é que o sistema político, da forma como está posto hoje, privilegia o dinheiro em detrimento da real política, ou seja, de nada adianta ter idéias e propostas inovadoras, inteligentes, coletivas, agregadoras, pois, no frigir dos ovos, o que vale mesmo é a bufunfa; quem tem mais grana, leva. Infelizmente, é assim que é! Campanhas milionárias quase sempre se saem vitoriosas. Só que não era para ser dessa forma. A política não é isso, não pode ser reduzida a esta ótica do “quanto mais dinheiro, mais chances de ganhar”.  Política se faz com sonhos e ideais, não com interesses obscuros e Reai$.

Dentro desse contexto, uma aberração do nosso sistema político é o financiamento privado das campanhas. Empresas fazem doações generosas de milhões de reais a candidatos que, obscuramente, escondem a identidade dos doadores. Em troca de quê? Ora, ora, de vantagens e facilidades em licitações e contratos público-privados em um futuro próximo, caso seus candidatos sejam eleitos. É a velha máxima: uma mão lava a outra. Trocando em miúdos, empresas capitalistas não fazem doação, realizam investimento. Alguém duvida?

Nesse sentido, de todas as mudanças necessárias que deveriam vir no bojo de uma reforma política consistente e transformadora, o fim do financiamento privado das campanhas tem de ser prioridade. Este modelo de financiamento explica, em boa parte, a relação promíscua entre políticos e empresários corruptores que, consequentemente, resulta na onda de corrupção que assola as esferas dos poderes legislativo, judiciário e executivo brasileiros. 

No entanto, a arrecadação privada para campanhas conta com um lobby poderoso em Brasília, pronto para defendê-la a qualquer momento, pois estes lobistas sabem que a implantação do financiamento público e equânime a todos como única forma de arrecadação de campanhas políticas esvaziaria grande parte do poder econômico e de influência dessas empresas doadoras e, principalmente, aumentaria consideravelmente as chances de vitória de candidatos não alinhados ao status quo.  

Hamlet, se saísse da sua Dinamarca e viesse passear por estas bandas, diria que há algo de podre na estrutura política brasileira. Pois é. Recomenda-se tapar o nariz para evitar o pior.

Um comentário:

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