quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

*Polícia, violência e corrupção: um caso (policial) de amor

Polícia, mídia e capitalismo: uma combinação nociva! (Charge: Carlos Latuff, no Vermelho)

**Por Artur Pires

Na última semana, a greve dos policiais militares cearenses - e principalmente o “Dia em que Fortaleza parou” - foi aqui abordada. Propositadamente, excetuando-se a conclusão do artigo, absolutamente nenhum comentário foi tecido a respeito da coerção, da corrupção e da violência policial, bem como do papel fundamental que essa instituição exerce como mantenedora do status quo. Este, pensei, era assunto para muitas outras linhas. 

Pois bem, trago o assunto à tona agora, instigado por mais um caso de agressão policial truculenta e gratuita. Dessa vez, filmado e amplamente divulgado nas redes sociais e pela internet afora: nas imagens (veja aqui), o sargento da PM, André Luiz Ferreira, agride covardemente o estudante da USP, Nicolas Menezes Barreto, durante a desocupação de um espaço que estava sendo utilizado pelo DCE daquela Universidade. Em um momento da agressão, o policial chega a sacar a arma da cintura para ameaçar o estudante. Além do modo inexplicável e violento como se dá a abordagem, o racismo do policial se configura claro na medida em que, no instante da ação, há diversos estudantes tentando dialogar com o “todo-poderoso” PM sobre o porquê da necessidade de retirá-los dali, mas ele escolhe para bode expiatório de sua truculência inveterada justamente o único negro no local.

Vale lembrar que, há pouco mais de dois meses, estudantes da USP ocuparam o prédio da reitoria para protestar contra a presença repressiva e autoritária da Polícia Militar nos campi da Universidade, entre outras reivindicações. O resultado todos sabem. Foram violentamente retirados do local por uma tropa de guerra da PM, após determinação da Justiça – poder constituído no qual a grande maioria dos seus componentes com poder de decisão (juízes, desembargadores e ministros do STJ e do STF) não pode nem ouvir falar em greves de trabalhadores e manifestações estudantis que se apressa a decretar atos dessa natureza como ilegais -, cumprida obedientemente à risca pelo governador tucano paulista Geraldo Alckmin e por seu fantoche na USP, o reitor João Grandino Rodas.

Abrindo aqui um parêntese, à época da ocupação da reitoria pelos alunos, a mídia burguesa - capitaneada pela rede Globo, pela revista Veja e pelos jornais O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo - e a sociedade civil conservadora, sempre de plantão, prontíssima para defender os “valores da família e dos bons costumes”, alcunharam os estudantes de “baderneiros que só queriam fumar maconha no campus”, enfatizando que a PM lá era importante porque “manteria a ordem e a lei”.

A mesma mídia empresarial que defendeu a repressão policial na USP canta loas e espetaculariza a invasão e ocupação, pela PM, com ajuda das Forças Armadas, de comunidades no Rio de Janeiro: as famigeradas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). O que não é retratado por esta mesma imprensa é que há uma quantidade absurda de casos de moradores que estão tendo seu direito de ir e vir cerceado pelos policiais - e militares do Exército, em alguns locais -, além de serem comuns denúncias de agressão e violência gratuita (veja aqui). Ademais, ainda surge agora a recente campanha de “higienização” que a PM paulista promove no centro de São Paulo, na cracolândia, onde expulsa à revelia os adictos daquela região da cidade, e, ao mesmo tempo, se omite a auxiliá-los psicossocialmente. Fecha parêntese.

Passados pouco mais de dois meses do episódio da ocupação da reitoria da USP, o que se percebe, principalmente após a divulgação das recentes imagens que correm as redes sociais, é que os estudantes desde sempre estavam cobertos de razão: a Polícia não tem nenhum preparo para lidar com o movimento estudantil e com qualquer outro movimento social e sindical. Age com a mesma coerção e violência que se acostumou historicamente a tratar aqueles que cruzam seu caminho – claro, desde que estes que cruzem o seu caminho não sejam ricos e poderosos.

Como dito nas primeiras linhas desse texto, a instituição Polícia existe para manter o estado das coisas, deixar tudo do jeitinho que está: uma minoria rica em detrimento de uma maioria miserável; uns morando em mansões, outros em casas de taipa e papelão; uns com um número infindável de oportunidades e escolhas à sua frente, outros em que as únicas oportunidades que lhes aparecem é se conformar com o seu destino de miséria ou partir para o tudo ou nada através de uma saída que se mostra de braços abertos a recebê-los: o crime... que não é o creme!

Funciona dessa maneira o modus operandi policial: protege-se a elite, que os classifica como defensores da lei e da ordem, e criminaliza-se a pobreza e a raça negra. Se for pobre e preto, meu deus, é um criminoso em potencial. Mas aí, quando a Senzala, não mais aguentando ser mantida por tantos séculos à margem dos processos sociais, políticos, econômicos e educacionais do País, parte para o confronto – que não é nada mais do que consequência direta e anunciada de um sistema que exclui e desiguala por natureza -, quem está lá para defender a Casa Grande? Logicamente, a Polícia, que presta proteção fiel aos “sinhôzinhos” – que, ainda assim, se encastelam em suas casas grandes rodeadas de muros altos, cercas elétricas… e, por via das dúvidas,  uma Ponto 40, engatilhada, guardada em cima do guarda-roupas, pronta para ser descarregada.

À parte essa simpatia toda para com os donos do poder e o olhar vulgar e atravessado aos herdeiros da Senzala, grande parte dos policiais ainda se empenha, disciplinados que são, em doutorar-se na “arte” de abarrotar os bolsos com extorsões e práticas de corrupção de toda ordem. “Comer o troco”, gíria para pegar dinheiro de extorsão, é linguajar comum entre os “puliça”.

Diante de todo o exposto acima, o mais preocupante é constatar que, apesar de todo o papel coercitivo e violento que a Polícia representa para a sociedade, esta, de tão anômala, não é sequer capaz de andar com as próprias pernas sem aquela seguradinha no ombro acolchoado do militar – vide o recente caso de um dia sem Polícia nas ruas de Fortaleza. O resultado desse condicionamento social é trágico: a anomalia da nossa sociedade, mergulhada num sistema desigual e alienador, que privilegia o dinheiro e, portanto, serve aos donos desse capital, casa perfeitamente com a função “social” de coerção e repressão que a Polícia desempenha. É isso o que vivemos! É isso o que queremos?

* Artigo publicado no Portal Vermelho
**Artur Pires é jornalista e palpiteiro de plantão

7 comentários:

  1. Também curti o texto.
    Eu não confio na polícia, além do abuso de poder rola muita corrupção.
    eu fico pensando sobre o que podemos fazer...
    Denunciar não é suficiente, porque no fim voce estara denunciando a policia para policia e eles se protegem.
    minha voz não é muda.
    expresso toda a minha revolta na arte.
    mas isso é suficiente?

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  2. A Polícia, infelizmente, não está preparada para lidar com ninguém. Essa é a triste realidade e o preparo, melhor dizendo, o despreparo desses militares é ridículo, infeliz e induz todos a esse tipo de comportamento de prestar um desserviço à sociedade! É lamentável!

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  3. Valeu pela leitura, Raíssa e Zacharias. Enfim, minha opinião sobre a PM está nas linhas do texto. Acrescento que defendo que a Polícia deveria ser desmilitarizada. A própria ONU recomendou que a PM brasileira fosse extinta, pois é uma das que mais mata no mundo. E quem são seus alvos preferidos? Os pobres, pretos, da periferia...a PM é totalmente seletiva na sua violência! Enfim, é uma instituição que deveria acabar!

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  4. Lixo esse texto, como qualquer outra generalização feita por "pilantras" desse tipo. A polícia tem a obrigação de manter a ordem, mas se não há, não tem como falar em diálogo. Muitos desse pilantras preferem exaltar à bandidos do que policiais, então tem que virar um deles, exemplo, esse Artur Pires de bosta .

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  5. Particularmente respeito a opinião de todos aqui, mas acredito que a culpa não vem da doutrina militar nem algo do tipo, claro que a policia não é perfeita, mas se ela fosse extinta, o que aconteceria? em 2017 a polícia militar do ES ficou de greve, e vocês lembram do que ocorreu no estado? ele simplesmente parou. claro, a corrupção é real sim, mas respeito a doutrina policial, afinal corrupção existe em todo o lugar, o que é irônico da minha parte, pois não gosto de generalizar, mas acredito que simplesmente falar que a policia deve acabar não é a resposta, o trabalho policial/militar não é nem um pouco fácil, e quando você vacila, algo muito ruim pode acontecer, ela deve ser responsabilizada quando acaba cometendo erros, mas tem casos que eu observo e não consigo entender quando a polícia é criticada, quando há uma manifestação por exemplo, tem que haver um mediador da PM, e a rota da manifestação deve ter um aviso prévio, além de haver algumas reuniões com os representantes do movimento para acertar certos detalhes, mas no pior dos casos acontece um confronto, aí você acaba vendo a mídia criticando os atos policias e etc, por ações que eles podem tomar legalmente, e a mídia acaba simplesmente colocando eles como vilões, tipo não faz sentido algum???

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